A cidade de Ilhabela é reconhecida como um importante local de
avistamento de aves, com exemplares de beleza inquestionáveis, como o
Saíra-sete-cores, o Tiê-sangue e mais de 300 espécies catalogadas. As
aves mais comuns de serem encontrados voando acima das residências e
pousadas nas árvores, no entanto, são os periquitos, maritacas e
papagaios, que anunciam sua presença com uma algazarra inconfundível.
A interação destes animais no ambiente urbano cria verdadeiras
armadilhas, debilitando todos os anos centenas de aves que precisam de
cuidados especiais para que possam ser reintroduzidas ao seu habitat.
Esse é justamente o objetivo do projeto financiado pela Prefeitura de
Ilhabela, por meio da Secretaria de Meio Ambiente, da Área de Soltura
Monitorada (ASM) Cambaquara, que conta com uma história de criação no
mínimo inusitada: o amor entre dois periquitos, a Pepa e o Kiwi,
naturais da região.
Apesar dos periquitos terem sido o estopim de tudo, a principal estrela
da ASM Cambaquara é o Papagaio-moleiro, ave símbolo do município de
Ilhabela e que se encontra na lista de espécies em risco de extinção no
Estado de São Paulo. A necessidade de conservação dessa espécie torna o
trabalho da instituição ainda mais importante, pois além dos cuidados
ainda registra os hábitos, alimentação e a interação com outros animais
da floresta e os urbanos.
Amor sem asas
O início da jornada para a fundação da ASM começou ainda em 2008, com um
periquito-rico fêmea (também chamado de Periquito-verde) apareceu
machucado no portão do casal Silvana Davino e Pablo Federico Melero,
fundadores da instituição. Silvana conta que, até então, nunca tinha se
envolvido em projetos de preservação da fauna ou com a biologia e
tratamento de aves.
“Na verdade, começou por acaso mesmo. Nunca imaginei que teria um lugar
para cuidar de aves, mas quando caiu aquele perequitinho no portão da
minha casa, sem poder voar, nós pegamos e começamos a cuidar dele. E eu
não entendia absolutamente nada sobre aves. Na época nós tínhamos um
funcionário que entendia muito sobre pássaros e ele acabou sendo o meu
primeiro professor, que me ensinou como deveria cuidar, alimentá-lo e a
segurar corretamente.
A partir daí eu comecei a me interessar, descobri que era uma fêmea, e
eu dei o nome à periquita de Pepa. De repente, um outro periquito
começou a visitá-la e ficou apaixonado por ela, mas ele era de vida
livre e eu não queria aprisioná-lo. Daí surgiu a necessidade de eu criar
um viveiro que servisse aos dois, onde o macho poderia entrar e sair
livremente, e ela, por ter a asa quebrada, não pudesse sair e ser
exposta aos predadores como gaviões ou até mesmo gatos domésticos.
Ao longo dos anos o casal fez seu ninho e tiveram mais de 60 filhotes em
mais de 14 ninhadas, todos do mesmo parceiro, que batizamos de Kiwi. Com
toda essa família precisei fazer um viveiro maior, para que todos
ficassem bem confortáveis. Isso já foi no ano de 2012”, conta.
Com o avanço dos trabalhos os responsáveis pelo projeto correram atrás e
legalizaram o local na Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São
Paulo como uma Área de Soltura Monitorada, reconhecimento conquistado em
2014.
Em 2024 a ASM Cambaquara comemora dez anos de existência e em todo esse
período já reabilitou cerca de 1.100 aves, entre elas tucanos,
papagaios, maritacas e periquitos.
A Instituição
A ASM Cambaquara é uma entidade homologada pela Secretaria de Meio
Ambiente do Estado de São Paulo desde 2014 e recebe recursos financeiros
da Prefeitura de Ilhabela através das Secretaria Municipal de Meio
Ambiente para a preservação da fauna silvestre nativa, com ênfase na
soltura, reabilitação e reintrodução de espécimes apreendidas pelas
autoridades oriundas de cativeiro irregular, resgatadas de acidentes
e/ou por meio de entregas voluntárias de populares.
As principais espécies reabilitadas são da família dos psitacídeos
(papagaios, periquitos e maritacas) e ranfastídeos (tucanos e araçaris),
vítimas principalmente de colisões em vidros, mordidas de cães e gatos,
cativeiro irregular, maus-tratos e até tiros de chumbinho. A ênfase é na
conservação do Papagaio-moleiro (Amazona farinosa), ave símbolo do
município.
Como Área de Soltura realiza inúmeros trabalhos de educação ambiental e
elabora relatórios anuais ao Ibama referentes aos animais soltos na
localidade, com todas as informações das espécies, marcação, sexo, e
mantém o órgão informado de toda alteração documental ou ambiental da
área.
“Esse projeto é de grande relevância na preservação das espécies de aves
ameaçadas de extinção, possibilitando a identificação e um diagnóstico
preciso no município”, destacou a Secretária de Meio Ambiente e
Engenheira Florestal, Kátia Freire.
Conheça os procedimentos e ações da Prefeitura de Ilhabela através da
Associação Cambaquara para a preservação de aves:
1 – Manejo das aves em reabilitação: examinar as aves recebidas,
marcá-las com anilhas, com o objetivo de facilitar a identificação
futura do indivíduo. Manter os cuidados com alimentação, saúde e higiene
e a depender do histórico de cada indivíduo, esse período que pode durar
de 2 meses a 2 anos;
2- Manejo das aves em fase de pré-soltura: treinamento das aves para
atender quatro requisitos básicos para sobreviverem em vida livre: voar
bem, identificar alimentos na natureza, fugir de predadores e ter medo
do ser humano. É em um recinto especial que o grupo é treinado e
avaliado até a soltura;
3 – Soltura: “Soft-realese”, que quer dizer “soltura branda”. realizado
por meio de um janelão dentro de um recinto aberto. As aves têm à
liberdade de sair e voltar quando quiserem. A alimentação é contínua,
tanto fora como dentro do recinto;
4 – Monitoramento das aves soltas: após a soltura, as aves são
acompanhadas durante 7 dias seguidos em dois horários, quando são
colocados os alimentos nos comedouros externos;
5 – Palestras de Educação Ambiental nas escolas: levar aos alunos o
conhecimento da fauna silvestre de Ilhabela, com atividades lúdicas para
incentivá-los na preservação da fauna local;
6 – Oficinas de Educação Ambiental com crianças e jovens: é uma forma de
trabalhar com a criança e o jovem de uma forma prática, oferecendo uma
vivência fora da sala de aula estimulando uma nova maneira de pensar e
criar.